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O Braço do Senhor

por T. Austin-Sparks

Capítulo 8 - A Cruz e o Espírito Santo

Leitura: Isaías 61:1-62:1a

Chegamos agora a outro aspecto deste fruto multifacetado da Cruz do Senhor Jesus. Lembramos que os três primeiros versículos deste capítulo sessenta e um de Isaías, tão completos, foram citados pelo próprio Senhor Jesus. Depois do Seu batismo abriram-se os céus, e o Espírito desceu e pousou sobre Ele: foi o grande momento da Sua unção como o Servo, que acabava de passar, simbolicamente, pelo caminho da Cruz, como representado pelo Seu batismo [o Jordão]. Agora, depois de ungido, Ele encontra o inimigo no deserto e o derrota completamente em todos os pontos; depois, voltando do deserto no poder do Espírito, Ele chega a Nazaré, onde foi criado.

No dia de sábado, Ele entra na sinagoga e as Escrituras lhe são entregues. Ele as abre neste ponto das profecias de Isaías e lê esses versículos; e, depois de lê-los, devolve o rolo ao chefe da sinagoga e se senta. (Isso, ao contrário do nosso costume, era um sinal de que Ele tinha algo a dizer. Se temos algo a dizer, geralmente nos levantamos; mas nas sinagogas, se eles tinham algo a dizer, sentavam-se). Então a Palavra dia que 'os olhos de todos' que 'estavam fixos Nele' - porque Ele havia se sentado; pois sabiam que tinha algo a dizer. “Então, passou Jesus a dizer-lhes: Hoje, se cumpriu a Escritura que acabais de ouvir” (Lc 4:14-21).

Vemos assim que o Senhor Jesus estava se apropriando desta parte de Isaías. Reconhecemos que existe uma relação entre essas profecias, o Senhor Jesus e esta dispensação, além de uma conexão com a história de Israel. E sobre isso que falaremos agora.

A Unção da Cabeça Flui para os Membros

Observe, então, que esta unção, repousando antes de tudo sobre o 'Servo do Senhor' - pois esse é o título de Cristo em Isaías: "Eis o meu servo" (Is 42:1) - enquanto esta unção repousa sobre Ele e se relaciona, de forma plena e suprema com Ele, como a Cabeça, a linguagem da narrativa profética imediatamente faz uma transição abrupta para a terceira pessoa. Após a declaração a respeito da unção do Servo, o texto de Isaías continua: “Edificarão os lugares antigamente assolados, restaurarão os de antes destruídos e renovarão as cidades arruinadas, destruídas de geração em geração” (61:4). O povo de Deus deriva dos valores e benefícios desta unção. É como se a unção sobre Ele, como Cabeça, simplesmente fluísse e abraçasse todos os Seus membros – os membros de Cristo.

É por isso que lemos o primeiro fragmento do próximo capítulo: “Por amor de Sião, não me calarei...” Como mencionei no capítulo anterior, temos muita coisa sobre Sião nestas profecias posteriores de Isaías - sobre o benefício da unção sendo encontrado em Sião, Sião herdando todos esses valores. E Sião, como sabemos, é a figura da Igreja no Antigo Testamento. Estávamos falando, naquele capítulo, da luz de Sião: “Dispõe-te, resplandece, porque vem a tua luz” (60:1) – este é o testemunho restaurado. Aqui, no capítulo 61, abordamos a vida e a liberdade de Sião.

"Para Proclamar Liberdade aos Cativos”

Perceba, antes de tudo, que esta é uma mensagem para Sião, para a Igreja. Tudo isto deve ter o seu cumprimento, sua realização no povo do Senhor. Israel, nesta ocasião, estava exilado na Babilônia, num estado de escravidão e morte espiritual, e as profecias têm a ver com a sua libertação dessa escravidão, dessa morte, este povo desfrutando de vida e liberdade. Disse que Jesus tomou para Si esta Escritura sobre a unção do Senhor estar sobre Ele, “para proclamar libertação aos cativos”, e assim por diante. Mas você deve se lembrar que a Sião terrena, a Jerusalém terrena – em outras palavras, o povo judeu – nunca chegou à realidade desta libertação. Eles perderam todos esses valores. Sião não herdou os valores de Sua unção, mas a Igreja herdou tudo isso. Esta se tornou a herança do Israel espiritual, do povo espiritual de Deus. O Judaísmo – “Israel segundo a carne” – foi o antagonista supremo da unção. Com a arma do legalismo, eles mataram o Senhor. Mas o povo que entra nesses valores adicionais da segunda parte deste capítulo, deve responder a tudo isso que é dito sobre a unção.

Ou seja, deve ser um povo capaz de apreciar a Boa Nova porque é manso: e isso não aconteceu com Israel segundo a carne. É necessário que esse povo tenha um coração quebrantado, e isso não era verdade em relação a Israel segundo a carne. O povo deveria ser consciente de que realmente era cativo, e isso não era um fato com os judeus nos dias de nosso Senhor. Eles pensavam e acreditavam que eram as pessoas mais livre na terra, os que menos sabiam sobre a escravidão. Esse era um dos pontos de controvérsia entre eles e o Senhor Jesus (Jo 8:33). O povo que recebe esses valores da unção deve perceber que o seu estado é de prisão, se quiserem desfrutar da “libertação dos algemados”; e assim por diante. Os valores da unção só podem chegar às pessoas que percebem espiritualmente, de todas estas maneiras, a sua necessidade deste Servo do Senhor, trabalhando, debaixo da unção, a seu favor, para o seu benefício.

A Contraparte do Novo Testamento

Seguimos agora o mesmo caminho que temos adotado anteriormente. Esta parte das profecias de Isaías, e este capítulo em particular, nos leva à uma contraparte do Novo Testamento. Vimos que existem partes do Novo Testamento que respondem distinta e claramente às diferentes fases e movimentos destas profecias de Isaías. E a contrapartida do Novo Testamento deste capítulo sessenta e um é, sem dúvida, a Carta de Paulo aos Gálatas. Vejamos alguns fragmentos dessa carta. Veja como eles trazem Isaías 61 à luz, a unção do Espírito.

Carta de Paulo aos Gálatas

"Quero apenas saber isto de vós: recebestes o Espírito pelas obras da lei ou pela pregação da fé? Sois assim insensatos que, tendo começado no Espírito, estejais, agora, vos aperfeiçoando na carne?... Aquele, pois, que vos concede o Espírito e que opera milagres entre vós, porventura, o faz pelas obras da lei ou pela pregação da fé?... Cristo nos resgatou da maldição da lei... para que a bênção de Abraão chegasse aos gentios, em Cristo Jesus, a fim de que recebêssemos, pela fé, o Espírito prometido” (Gl 3:2,5,13,14).

“E, porque vós sois filhos, enviou Deus ao nosso coração o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai!” (4:6).

“Porque nós, pelo Espírito, aguardamos a esperança da justiça que provém da fé.” (5:5).

"Digo, porém: andai no Espírito e jamais satisfareis à concupiscência da carne. Porque a carne milita contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne, porque são opostos entre si; para que não façais o que, porventura, seja do vosso querer. Mas, se sois guiados pelo Espírito, não estais sob a lei... Se vivemos no Espírito, andemos também no Espírito" (5:16-18,25).

“Porque o que semeia para a sua própria carne da carne colherá corrupção; mas o que semeia para o Espírito do Espírito colherá vida eterna” (6:8).

Tudo isso, como você percebe, tem a ver com o Espírito – o que é, obviamente, outra maneira de falar da unção. Tomaremos agora outra breve série de versículos, que segue a linha da Cruz.

“Estou crucificado com Cristo; logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim” (2:19,20).

"Ó gálatas insensatos! Quem vos fascinou a vós outros, ante cujos olhos foi Jesus Cristo exposto como crucificado?" (3:1).

“E os que são de Cristo Jesus crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências” (5:24).

“Mas longe esteja de mim gloriar-me, senão na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim, e eu, para o mundo” (6:14).

Estas duas séries de versos desta breve carta “às igrejas da Galácia” (1:2) deixam claro que dois dos seus temas principais são a Cruz e o Espírito Santo. É a ponte entre Isaías 53 e Isaías 61.

A Natureza Essencialmente Espiritual do Cristianismo

Agora todos sabemos que esta Carta aos Gálatas contém a tremenda batalha de Paulo. Sim, Paulo estava disposto a lutar quando se propôs a escrever este documento. Não há produto mais veemente da pena de Paulo do que esta carta. Mas qual é a razão da batalha? Sobre que assunto? É claro que existem respostas teológicas e doutrinárias para essa questão; mas pode-se dizer, com bastante apoio tanto da própria carta como de outras partes do Novo Testamento, que esta batalha de Paulo estava toda relacionada com o caráter essencialmente espiritual do Cristianismo. O verdadeiro Cristianismo é algo essencialmente espiritual. É disso que se trata esse combate. Paulo nos mostra tão claramente, em todos os aspectos, que a Cruz leva a uma posição espiritual, a uma condição espiritual.

O grande inimigo, que tinha instrumentos muito úteis nos judaizantes, lutava para fazer do cristianismo algo diferente de algo espiritual; trazê-lo para uma base diferente. Desde então, o inimigo tem procurado restringir o Cristianismo numa questão de ritos e cerimônias – rituais, formalismos, símbolos terrenos e temporais, representações, figuras, e assim por diante; ou, na ausência dessas coisas, substituí-las pela falsa espiritualidade, por vezes dignificada pelo nome de “misticismo”. Esse era o objetivo de Satanás, e Paulo viu que a questão era nada menos do que o verdadeiro significado, a natureza essencial do Cristianismo – o que ele é. E Paulo não ia abrir mão disso, porque ele tinha tido uma experiência tremenda nesse exato ponto. Ele, portanto, decidiu lutar com todas as forças ao seu alcance, para deixar perfeitamente claro que o Cristianismo não é de forma alguma um sistema terreno - é uma vida celestial. O Cristianismo é essencialmente uma vida no Espírito, e a Cruz pretende produzir isso. Se ela não o produz, há alguma razão para isso nos envolvidos. Significa que toda a natureza do Cristianismo foi mudada e o significado da Cruz foi subvertido.

Assim, Paulo ataca esse movimento sutil do inimigo com toda a força da cruz e traz consigo todas as armas que pode usar. Quais são algumas dessas armas?

As Armas de Paulo Contra a Degradação do Cristianismo

(1) Sua História Pessoal

Bem, antes de mais nada - e esta é uma arma muito poderosa, como você notará nesta carta - Paulo traz a arma de sua própria história e de sua própria experiência. Há poucos lugares em todos os seus escritos – talvez apenas em Segunda Coríntios – onde ele se refira mais a si mesmo do que nesta carta. Ele fala sua própria história e experiência; esse é um de seus golpes de mestre. E ele era o homem certo para fazer isso! Basta olhar para Saulo de Tarso: olhar para a sua história – o que ele nos conta a respeito dela. Já houve um homem que colocou todo esse sistema judaico à prova de forma mais completa do que ele? Ele havia se comprometido com as observâncias, com a execução de cada parte do ritual judaico até o fim. Na verdade, ele nos diz que era muito mais zeloso nesse assunto do que muitos de sua idade. "E, na minha nação, quanto ao judaísmo, avantajava-me a muitos da minha idade, sendo extremamente zeloso das tradições de meus pais." (Gl 1:14). Este homem percorreu todo o caminho com este sistema, com as suas cerimónias e ritos, os seus tipos e figuras, os seus símbolos e formas; ele foi até o fim.

O que isso fez por ele? Onde isso o levou? Ele o exauriu de forma completa, conscienciosa e sincera: porque uma coisa que temos a dizer sobre Saulo de Tarso é que ele era um homem que não acreditava em meias medidas - falava sério, e era sincero no que fazia. Ele nos diz: “Na verdade, a mim me parecia… que muitas coisas eu devia praticar” - 'pensei que devia fazer ' - “contra o nome de Jesus, o Nazareno” (At 26:9). Essa era uma questão de consciência para este jovem fariseu brilhante, que subiu tão alto na escala do Judaísmo. Mas onde isso o levou? Temos sua própria exclamação; ele diz: 'Foi aqui que isso me levou!' - "Desventurado homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte?" (Rm 7:24). Você não poderia ficar muito abaixo disso, não é? Essa é a última palavra em qualquer coisa. Na sua própria experiência, na sua história, tudo falhou. Na verdade, ele diz: 'Foi aí que isso me levou; isso foi tudo que esse sistema fez por mim. E não vai fazer nada melhor para ninguém, por mais dedicados que sejamos a ele.

(2) O Significado da Cruz

Tendo chegado a esse fim ignominioso, clamando por libertação - 'Ó homem miserável que sou, quem me livrará? Nada nem ninguém, ao longo de toda esta longa história, provou ser um libertador adequado para mim!' - Paulo encontrou o Senhor Jesus; e o Senhor Jesus fez por ele tudo o que todo o sistema falhou completamente em fazer. Ele encontrou a cruz e disse: “Estou crucificado com Cristo; logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim” (Gl 2:20). Você percebe a mudança do pensamento de “morte” para o pensamento de “vida”. Ele é um homem morto vivificado, que voltou à vida. Ele conheceu um novo começo, uma nova história, uma nova experiência, que nasceu da Cruz do Senhor Jesus.

Além disso, Paulo encontrou o Espírito Santo, e o Espírito Santo fez por ele o que este vasto sistema do Judaísmo, ao qual ele se entregou tão completamente, nunca poderia fazer. É por isso que ele dá um lugar tão importante ao Espírito Santo nesta carta. É por isso que a Cruz e o Espírito Santo são trazidos como linhas orientadoras de todo este testemunho. O Espírito Santo, no terreno da Cruz, inverteu toda a experiência, mudou toda a situação.

(3) O Significado de Cristo

E então – aqui poderíamos percorrer a carta tomando outra linha dominante – Paulo descobriu o verdadeiro significado de Cristo. O nome de Cristo ocorre quarenta e três vezes nesta pequena carta, que pode ser lida em dez minutos ou um quarto de hora. Isso é significativo; na verdade, é como se gritasse para nós sobre o tema da epístola. Paulo está realmente procurando mostrar aqui qual é o verdadeiro significado de Cristo. Qual é o verdadeiro significado de Cristo? Apenas isto: que todo esse sistema foi – em Si mesmo – completamente cumprido. O vasto sistema da lei e todas as suas ordenanças foram cumpridas em e por Cristo, na Cruz; toda a justiça foi cumprida. Ao ser batizado no Jordão, tipificando Sua morte na Cruz, Jesus disse: “Deixa por enquanto, porque, assim, nos convém cumprir toda a justiça.” (Mt 3:15). Essa era a questão que estava em jogo, e tudo se cumpriu na Cruz do Senhor Jesus; Cristo crucificado cumpriu tudo. O Antigo Testamento é cumprido em Cristo. É isso que falamos sobre Isaías; e o que é verdade para Isaías é verdade para todo o Antigo Testamento. Não poderemos tentar mostrar aqui como o Antigo Testamento se cumpriu em Cristo, mas é isso que Paulo está dizendo. 'Fui crucificado com Cristo: e por isso estou unido a Ele nessa anulação, nesse cumprimento de todas as exigências de Deus; e, pelo Espírito, chego ao benefício de tudo o que Jesus é.'

(4) O Significado da Graça

Temos outro tema nesta carta que vale a pena estudar: é o significado da graça. Isso é algo grandioso na Carta aos Gálatas. A graça nos coloca em uma base inteiramente nova. Todo o ritual, as formas, as exigências da lei, apenas serviram para acentuar a nossa má consciência. Paulo deixa isso muito claro. Como sabemos, esta Carta aos Gálatas foi escrita antes da Carta aos Romanos: provavelmente Paulo, quando escreveu aos Gálatas, disse consigo mesmo: 'Devo escrever algo mais sobre isto', e então aproveitou a oportunidade para ampliar esse assunto ao escrever aos romanos. Mas a questão é que tudo estava relacionado com esta questão de consciência. "Mas eu não teria conhecido o pecado... se a lei não dissera: Não cobiçarás…” (Rm 7:7). ‘Apenas dizer isso já afetou minha consciência: todo esse sistema estava apenas mantendo minha consciência viva - não estava me salvando de uma consciência má. Mas a graça fez isso; a graça me colocou em uma base totalmente nova e diferente, onde a má consciência é tratada.' Sim, a graça trata da consciência. Que palavra maravilhosa contra uma má consciência: “A Graça de Deus”.

(5) O Significado do Espírito Santo

Por último, Paulo descobriu o significado do Espírito Santo. O que Paulo diz de maneira preeminente sobre o Espírito Santo aqui? “E, porque vós sois filhos, enviou Deus ao nosso coração o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai!” (Gl 4:6). “Recebestes o espírito de adoção, baseados no qual clamamos: Aba, Pai.” (Rm 8:15). Paulo coloca isso contra a servidão. E aí ele vai direto ao cerne da questão. Pois se reconhecermos, como é fácil fazer, a diferença entre um servo e um filho, teremos o segredo de tudo.

Um servo é alguém que simplesmente tem que fazer o que lhe é ordenado. Alguém lhe diz que deve ou não deve, e, quer ele goste ou não, concorde com isso ou não, cabe a ele obedecer, e isso é tudo. Quaisquer que sejam as suas reações, ele não consegue evitar: pois é apenas um servo. Interiormente ele pode estar positivamente revoltado contra tudo que está acontecendo, mas não pode fazer nada a respeito. Estou falando, é claro, de um servo daquela época. Um servo dos dias de hoje simplesmente desistiria do seu emprego e iria embora - é assim que acontece nos dias de hoje. Mas você não poderia fazer isso lá no Império Romano nos dias de Paulo. Um escravo não tinha poder de escolha; ele não poderia dizer: 'Estou renunciando. Vou encontrar outro mestre' - ele simplesmente não podia. Ele foi comprado em corpo, alma e espírito; e, embora ele pudesse estar revoltado com todas as fibras do seu ser, não havia nada que pudesse fazer a respeito. Ele simplesmente era o escravo desta lei.

O Espírito de Filiação

Isso é um servo, um escravo. O que é um filho? Bem, se ele é um filho no verdadeiro significado da filiação cristã, o seu serviço é uma delícia para ele. Existe uma dinâmica do amor: ele se deleita em fazer as coisas que agradam ao seu Pai, e esse amor lhe dá o incentivo e o poder para fazê-las. Ele tem outro espírito, o Espírito de Filiação trabalhando nele, tornando-lhe possível responder a todas as exigências: pois esse é o significado do Espírito Santo – um poder interior, de amor, que torna tudo possível. Como todos sabemos, se tivermos um grande amor por alguma coisa, nada é impossível! Gostaríamos de possuir mais deste amor - o amor que não irrita, que não espera até que as coisas sejam indicadas e que sua atenção seja atraída para elas, mas está o tempo todo alerta, ansioso e atento, observando o que precisa ser feito. Precisamos desse espírito, não é?

Isso é algo que impressiona em alguns grupos que conhecemos no Extremo Oriente. Menciono aqui a título de ilustração e exemplo, não como forma de condenação ou crítica aos demais. Uma grande sala de reuniões, por exemplo, com capacidade para 1.600 pessoas internamente e capacidade para mais 3.000 pessoas nos arredores, e com seus 1.000 painéis de vidro, precisa, como você pode imaginar, de muito cuidado - com a limpeza, o cuidado de todas as instalações elétricas, dos amplificadores e assim por diante. Há tanta coisa conectada até mesmo com um local como esse. Depois de cada reunião você vê um exército de homens e mulheres, preparados, e indo direto ao assunto, varrendo, limpando e enxugando, ajustando e cuidando das coisas, para que tudo esteja limpo e saudável e no devido lugar, para a próxima reunião. Ao observar essas pessoas trabalhando, talvez você pergunte sobre uma pessoa que está ocupada trabalhando com suas roupas velhas: 'Quem é esse irmão?' 'Oh! esse é o major-general fulano de tal!' Você vê outro homem mais jovem se dedicando a um trabalho sujo: 'Quem é aquele irmão mais novo?' 'Ele é o Diretor Geral da maior fábrica têxtil desta ilha!' E assim você prossegue – General, Coronel, Diretor – mas todos eles estão “tomando a frente”. Um desses altos oficiais decidiu limpar aquelas mil vidraças uma vez por semana!

Como eles fazem isso? Bem, antes de começarem o trabalho, todos se reúnem, oram e louvam. Eles oram todos juntos, esse grande exército de trabalhadores, depois louvam bastante; e começam a trabalhar. Tudo é feito com um espírito de alegria como esse. Esse é o espírito de filiação! Isso não é escravidão; é o verdadeiro espírito de filiação. Precisamos de muito mais disso. Esse é o significado do Espírito Santo. Você não fica surpreso que essas pessoas sejam radiantes, e não se espanta que a pergunta - “A quem é revelado o braço do Senhor?" seja respondida no caso delas. Na verdade, é revelado ali. Salvo a ilustração; é muito saudável ter visto essas coisas realmente funcionando. Essas pessoas servem; eles realmente trabalham.

Este é então o significado do Espírito, o significado de Cristo: o verdadeiro espírito de filiação. Isso é o que Paulo está dizendo aqui. Satanás vai contra isso – simplesmente odeia esse espírito. Ele tentará estragar tudo, a todo custo. Essa era a batalha em que Paulo estava. Ele não estava apenas lutando com os judaizantes, mas com o antagonismo direto do grande inimigo contra um testemunho desse tipo – contra o verdadeiro fruto da Cruz.

Liberdade da Lei significa Governo pelo Espírito

Agora, se Satanás for frustrado em uma linha, ele não desistirá – ele tentará outro caminho. Satanás é um grande mestre da estratégia, e uma de suas iniciativas favoritas é levar as coisas ao extremo. Entre os crentes da Galácia, ele procurou levar o legalismo ao extremo. Mas agora ele está frustrado; Paulo vence a batalha – não há dúvida disso. Qual é a próxima linha de ataque do inimigo? 'Muito bem então', diz ele, 'se você não tem a lei, então não tenha nenhuma lei; descarte toda a lei.' “Você não está mais debaixo da lei, você está debaixo da graça” - você pode fazer o que quiser! Comporte-se como quiser; prossiga fazendo o que desejar; você não precisa de limitações, nem restrições. Qualquer tipo de restrição é lei – repudie-a! Vá para o outro extremo: licenciosidade em vez de lei!' Acredito que, se Paulo estivesse vivo hoje, ele seria tão veemente contra isso quanto foi contra o legalismo: pois aqui está realmente uma obra de Satanás. Se Satanás não puder aprisionar pela lei e mudar toda a natureza das coisas assim, ele tentará rejeitar toda a lei e tornar-nos totalmente iníquos.

Mas lembre-se, se esta Carta aos Gálatas é a carta da liberdade do Espírito, é também a carta do governo do Espírito. Só somos livres quando somos governados. Nas conhecidas palavras de George Matheson, que às vezes cantamos:

'Faça-me um cativo, Senhor,

e então livre serei’

Um paradoxo – mas quão verdadeiro! Não somos livres quando cedemos à licenciosidade, quando levamos a liberdade a esse ponto. Não: esta Carta, e as Cartas aos Romanos e aos Hebreus, não são documentos da ilegalidade. Mesmo que ponham de lado todo o sistema judaico, não introduzem um regime de anarquia. Mas eles trazem claramente a vida e o governo do Espírito Santo. Lembre-se: nenhum filho de Deus que seja governado pelo Espírito Santo, que esteja realmente vivendo uma vida no Espírito, infringirá qualquer princípio Divino. Na verdade, uma vida governada pelo Espírito Santo será ainda mais meticulosamente cuidadosa com os princípios espirituais.

Nenhuma Mudança nos Princípios Divinos

Veja, a mudança não está na lei; e foi aí que um grande erro foi cometido. Cristo crucificado não altera a lei; O próprio Cristo não altera a lei; o Espírito Santo não modifica a lei. A mudança não está na lei – a mudança está no homem. Graça não implica em que, porque você não está debaixo da lei, você pode agora assassinar e escapar impune; pode roubar agora, e não está sob a lei; pode cometer adultério pois não está debaixo da lei; pode cobiçar agora, pois não está sob a lei. Graça não indica isso; você fica horrorizado com essa sugestão.

Mas leve esse direito a tudo e qualquer coisa do princípio Divino - e lembre-se de que a Lei de Moisés é apenas a personificação dos princípios Divinos. Agora o Senhor Jesus pegou isso e disse: 'Moisés disse: Não matarás; Eu lhe digo que se você estiver zangado com seu irmão, você não estará menos em perigo de ser julgado” (Mt 5:21,22). O apóstolo João vai mais longe, e diz que se você odeia o seu irmão você é um assassino: se você o odeia, sem tomar nenhuma medida para matá-lo, você já é um assassino no seu coração (1 João 3:15). Tomemos novamente as palavras do Senhor Jesus: 'Moisés disse: Não cometerás adultério; Eu lhes digo: basta olharem com má intenção e vocês quebraram o mandamento' (Mt 5:27,28). É o princípio da coisa, você vê. Isso é terrivelmente procurado.

Não, nem Cristo, nem o Espírito Santo, nem a Cruz mudam a natureza da lei, o princípio da lei – é o homem que é mudado. É assim que a lei é retirada de nós, porque nos tornamos pessoas mudadas. O Espírito, que guarda a lei, agora entrou em nós, e se andarmos pelo Espírito, no Espírito, não satisfaremos os desejos da carne (Gl 5:16,25). É uma questão da pessoa ser transformada.

Andar pelo Espírito é Guardar a Lei

Portanto, a graça não diz: 'Você não está mais debaixo da lei, portanto não precisa observar o sábado.' Devemos reconhecer que o sábado é a personificação de um princípio: não um dia. É o princípio sobre o qual Deus constituiu a criação, em todos os domínios; que deve haver um período de descanso para algo novo. Em toda a natureza é preciso haver um período de descanso, a fim de nos prepararmos para algo novo. Nossos corpos precisam de um período de descanso antes de algo novo. Em assuntos espirituais, no serviço espiritual, são necessários períodos de descanso, para o Senhor poder falar conosco e nos dar algo novo – esse é o princípio do sábado. Mas mesmo aí, o Senhor graciosamente tornou possível que muitos ainda tivessem um dia por semana para deixar outras coisas de lado, santificando-o para o Senhor, para a renovação espiritual.

Então perceba que é o princípio que importa, não a forma exterior. Nada muda o princípio. Os princípios de todas as leis Divinas são permanentes: nunca são revogados, nem deixados de lado ou anulados – eles ainda estão válidos. Jesus foi além do código de conduta e apontou o dedo para o princípio de cada parte dele; dizendo: Você não deve ser governado por um sistema exterior de 'farás' e 'não farás'; você deve ser governado pelo Espírito Santo que observa essas coisas. O Espírito é o Espírito de santidade: ninguém que vive no Espírito e faz coisas profanas de forma persistente, habitualmente. O Espírito Santo é o Espírito do amor: ninguém que vive no Espírito terá outro espírito além do Espírito do amor, nem deixará de observar as leis do amor. O Espírito Santo é o Espírito da verdade: ninguém que vive no Espírito e pelo Espírito será falso, em qualquer sentido - e a inverdade abrange não apenas que falamos, mas tudo na vida que não é real, genuíno, honesto e transparente. O homem ou a mulher que vive no Espírito será verdadeiro, alguém real. O Espírito Santo é o Espírito de sabedoria, e aqueles que vivem no Espírito terão uma sabedoria Divina governando suas vidas.

É a vida no Espírito, por intermédio da Cruz, que está sendo vislumbrada aqui. As pessoas a quem o Braço do Senhor será revelado são o homem, a mulher, a assembleia ou igreja que andam e vivem no Espírito. Será que queremos conhecer o poder de Deus – Deus conosco, Deus por nós? Então esse é o caminho: a Cruz é a nossa base, o Espírito é a nossa vida, caminhando e vivendo como filhos de Deus.

Em consonância com o desejo de T. Austin-Sparks de que aquilo que foi recebido de graça seja dado de graça, seus escritos não possuem copirraite. Portanto, você está livre para usá-los como desejar. Contudo, nós solicitamos que, se você desejar compartilhar escritos deste site com outros, por favor ofereça-os livremente - livres de mudanças, livres de custos e livres de direitos autorais.